A história da humanidade apresenta várias eras marcadas por seus contextos, necessidades e visão de mundo (paradigma).
De acordo com Ken Wilber e Frederic Lelux estamos vivendo uma crise de percepções sob a visão de diferentes paradigmas.
Dentro da perspectiva sistêmica, toda a crise, sofrimento, conflito ou prejuízos são apenas indicadores de que o modelo mental operante não mais atende as necessidades do contexto atual.
Olhar para esta longa trajetória do passado nos ajuda a compreender sobre o atual contexto e sobre o movimento crescente de organizações que estão operando sob um novo paradigma: as organizações orgânicas.
Um pouco de história: a trajetória do passado
Dentro da perspectiva sistêmica, quando não se conhece a própria história, o ser humano tende a repeti-la.
Conhecer o passado ajuda aprender sobre a realidade presente. Assim como aprender com o passado ajuda a criar um futuro diferente e viver um presente com mais abertura e consciência.
Quando olhamos para o passado reconhecemos que o modelo mental e a estrutura que organiza a maioria dos sistemas coletivos como as organizações são as mesmas do século XVIII. Estamos falando da Revolução Industrial.
A Revolução Industrial também rompeu um paradigma anterior e foi marcada pela era do Iluminismo que recebeu este nome em oposição à era medieval conhecida como a era das Trevas. Naquela época de conquistas e exploração, os dogmas religiosos eram impostos e existia uma enorme repressão à ciência. Muitas barbáries eram acometidas para eliminar toda as diferenças. Para sobreviver era preciso obedecer.
Ao final, por conta de tantos excessos e faltas, a tensão já tinha ultrapassado o seu limite e o rompimento com a Igreja e os impérios dominantes aconteceu como consequência de vários movimentos tensores de mudança.
Neste terreno fértil de insatisfações, incompreensões e necessidades não atendidas, filósofos e pensadores ativistas, como René Descartes(“Penso, logo existo”), criaram uma visão de mundo separatista, racional e individualista. Por isso, conhecemos este modelo como sendo cartesiano.
As premissas deste modelo cartesiano criaram uma visão de mundo mecaniscista, ou seja, tudo o que existe é visto como um sistema simples, uma máquina, por exemplo, e tudo o que não puder ser explicado não era considerado.
Vale ressaltar que, naquele contexto e naquela época, a separação foi importante, assim como o valor pelo indivíduo e a racionalidade da ciência. Muitas mudanças e criações importantes aconteceram.
Os valores que nortearam a cultura da época foram os catalizadores para saltar da era medieval para uma outra era que precisava descobrir muitas coisas e ter a liberdade de questionar o que antes era dogma religioso.
Separatista-racionalista:
O mundo, a vida e o todo foram fragmentados em partes para melhor análise, compreensão e controle.
A razão foi separada da emoção, o pensamento era linear, objetivo, pragmático e simplista. Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa”
A essência divina e suas questões espirituais foram renegadas, assim como a religião foi separada da ciência, que por sua vez, considerava real e valoroso somente o que era medido, testado e comprovado.
O individuo e tudo ao seu redor era visto como máquinas com peças e engrenagem dentro de um sistema simples, fechado e controlado.
O mundo materialista substituiu a visão do mundo espiritual e o ser humano foi coroado rei do mundo no topo da cadeia alimentar.
Individualismo- Ego:
A estrutura social triangular e hierárquica apenas ficou diferente, ou seja, a estrutura vertical de topo (minoria) e base (maioria) continuou a mesma. E continua até hoje na sua maioria!
O individuo passou a ser mais importante do que o coletivo e como apenas uma minoria poderia ocupar este lugar de destaque, novos valores surgiram como o individualismo e a competição que somaram com os valores anteriores como o status e o poder sobre o outro.
O eu, o meu e “mais o melhor do que o outro” passou a ser reconhecido como valor e diferenciação
O ego, ou o falso eu, antes condenado e reprimido no contexto anterior, saiu livremente do seu papel de gerente do mundo interno e tomou o poder e o controle da essência ou do verdadeiro eu (self).
Uma das maiores funções do ego é trazer ordem ao caos e segurança para o mundo interno. Sua dinâmica interna enxerga o mundo escasso e separado e seu maior foco é atender exclusivamente suas necessidades, mesmo que seja em detrimento de outros.
Sob esta direção a mente passa a reprimir o que não é aceito pelo mundo externo, sobreviver implicava fingir ser o que não é, exercer poder sobre os outros, ou seja, fazer de tudo para se manter na zona de conforto recheada de ilusões e protegidas por suas convicções.
Paradigma anterior
Esta visão de mundo ou modelo mental criou uma cultura para atender as necessidades daquele contexto específico cujas necessidades eram de liberdade de pensamento, pesquisa científica, assim como quantidade e diversidade, ou seja, criação de novos produtos, produção em massa etc.
A gestão por comando, controle e poder centralizado continuou operando. Assim como a estratégia de guerra e conquista, ou seja, eu e eles, nós e o inimigo, o que leva ao ganha-perde.
A informação e o conhecimento era restrito, pesado e de difícil acesso. Quem os tinham tinham poder. Hoje temos quase toda a informação nas mãos. Antes era necessário decorar, hoje precisamos reaprender a aprender.
Precisamos desaprender, resignificar, fazer diferente.
Presente, novo contexto e novas necessidades
Acontece que o contexto atual se mostra muito diferente das épocas anteriores, as pessoas sofrem muito mais pelo excesso e desequilibrio do todo do que pela falta de suas partes. Hoje morre se muito mais de obesidade, depressão e stress do que de fome, guerra e peste (mesmo com o Covid-19).
Ao contrário da falta de conhecimento e higiene do passado, a pandemia que enfrentamos hoje é produto das escolhas que os seres humanos fizeram e estão fazendo.
Além de tanto excesso e diversidade, o advento da tecnologia e a internet trouxe ao mundo uma complexidade, velocidade, volaticidade e incerteza jamais vista.
Com a globalização, a ampliação de diferentes perspectivas e a quebra de muros e paredes, o ser humano passou a sentir novas necessidades, além do ego, e, assim, passou a enxergar sob uma nova consciência e visão sistêmica da vida, incluindo toda a sua complexidade, incerteza e relatividade.
Todo este novo contexto foi reforçado pelas descobertas das novas ciências biológicas, físicas e humanas, como a epistegenégica, a física quântica, a neurociência e a psicologia transpessoal e do desenvolvimento, por exemplo.
Desta forma, foi percebido que não basta atender as necessidades do ego e da matéria, mas encontrar realização e significado em um propósito maior a partir da transformação pessoal e das relações mais íntegras, colaborativas e saudáveis. Novas necessidades foram criadas na nova era.
Novos caminhos, novos paradigmas, novas organizações
O desafio é mudar a mentalidade e transformar as organizações em sistemas orgânicos, ou seja, abertos e responsivos ao externo, ao mesmo tempo adaptáveis e em constante movimento, mudança e aprendizagem. (Isso acontece por uma dinâmica de associação e desenvolvimento para atender às novas necessidades do momento).
Esta tem sido a inovação das startups e o convite para se resgatar a essência e a integralidade perdida.
Dentro desta perspectiva e mentalidade sistêmica, o trabalho de mentoria existe para que as organizações possam se transformar de máquinas simples à sistemas orgânicos.
E, para isso acontecer, são necessárias condições mínimas para se começar: vontade e envolvimento dos fundadores e líderes estratégicos;
• ambiente psicológico e emocional seguro;
• acordos alinhados e
• a co-construção do novo.
Afinal, somos todos um, tudo é orgânico e não existem receitas e nem garantia de nada. Estamos aprendendo juntos, assim como se ajustando e evoluindo enquanto um sistema vivo coletivo.
Uma coisa é certa, quando se respeita aquilo que é e age de acordo com suas características e princípios, as chances de dar certo são muito maiores.
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